sábado, 15 de março de 2008

Patrick What?

Já tinha lido, por aí, que os espectáculos ao vivo de Patrick Watson são consideravelmente diferentes dos registos estúdio. Ora bem, convém esclarecer que Patrick Watson, compositor da banda que dá pelo mesmo nome, nascido na Califórnia mas criado no Quebec, cedo evidenciou apetência para a música. Participou em coros de igreja, estudou jazz e piano clássico, e colaborou com os Gangster Politics (grupo de ska que integrou no liceu). Inesperadamente é a referência ao jazz que interessa agora. Porquê? Porque o jazz é uma expressão musical «rebelde», ou seja, partindo de uma base há imenso espaço para a exploração e experimentação. Foram esses os dois pontos que mais surpreenderam na noite do passado dia 13 de Março na Aula Magna. Partindo dos acordes, melodias e cadências base gravadas em «Just Another Ordinary Day» (2003) e «Close To Paradise» (2006) Patrick Watson e irmãos de estrada demonstraram como se pode e deve revisitar canções em formato live sem perder o norte. Todavia, há que expor a inicial apatia do público presente que, ansioso por ver e ouvir os temas de «Close To Paradise», lá foi decifrando excertos das mencionadas composições e adaptando-se gradualmente às sonoridades ora Godspeed You! Black Emperor, ora Pink Floyd, ora Sigur Rós, ora Mogwai e à frenética e esquizóide forma interpretativa de Mr. Watson. Assim sendo ninguém estranhou e todos menearam e aplaudiram ao som da versão mais country e mais festiva de «The Storm», ao turbilhão sonoro que foi «Drifters», ao ensaio indie de «Shame» (extraído da estreia «Just Another Ordinary Day»), ao melodioso e intrigante «Luscious Life», à visão mais cabaret alienado de «Weight Of The World», ao belíssimo momento que foi «The Great Escape» ou ao improvisado «What?» (título escolhido pelo público presente) e à versão de Eric Satie (disse que não, mas lá acabou por apresentar as duas opções colocadas à nossa escolha…). Numa sala bem preenchida, Patrick Watson revelou-se um excelente comunicador e melhor entertainer: após a actuação da banda holandesa que assegurou a primeira parte certificou-se que estava tudo ok com o seu piano; queixou-se da zoada que um dos seus instrumentos emanava; afirmou a sua amizade pelo povo português, apesar de se precipitar algumas vezes para o merci; interpretou à capela e do balcão que divide as cadeiras doutrinais da restante plateia «Man Under The Sea»; cantou os parabéns a um dos presentes; e no fim autografou alguns discos à saída do recinto. Firmou a sua posição de compositor de excepção perante o público presente e deu mostras de vir a ser um forte caso de culto em Portugal.
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Aproveitamos a boleia do concerto do canadiano Patrick Watson e da sua banda na Aula Magna para, mais uma vez, repescar um dos discos em lista de espera para se apresentar neste espaço «sonhador». Em finais de 2007 e princípios de 2008 Patrick Watson surpreendeu muitos com «Close To Paradise», o segundo álbum do(s) canadiano(s). É certo que alguns já conheciam o principal compositor, através da colaboração em «Ma Fleur», álbum de 2007 da Cinematic Orchestra. No entanto, julgo que estaríamos longe de perceber que alguns meses antes de «Ma Fleur» existiu «Close To Paradise». Editado em 2006 e descoberto no velho continente em finais de 2007, «Close To Paradise» é mais um dos grandes discos a serem produzidos em terras canadianas. «Just Another Ordinary Day» marcou a sua estreia em nome próprio, em 2003. Porém, foi com o segundo álbum que se mostrou ao mundo, vencendo o galardão máximo do Polaris Music Prize (o equivalente canadiano ao inglês Mercury Music Prize). Sâo reconhecíveis vários parentes musicais que vão desde Nick Drake à música impressionista (por exemplo, Debussy), passando por Jeff Buckley ou Björk. Em muitos momentos, revela uma fragilidade arrepiante à Antony Hegarty (Antony And The Johnsons) ou envereda por uma pop meio clássica, meio indie de Rufus Wainwright, Sufjan Stevens, Ben Folds e Jens Lekman. A voz, essa, é um misto entre a versatilidade de Jeff Buckley e a citada fragilidade de Antony. Atributos ao serviço de «Close To Paradise», um dos discos mais intrigantes, belos e sensuais dos últimos meses. Puro lirismo, dirão muitos. Disco com as cuidadas partículas que vestem a sonoridade indie oriunda de Montreal, dirão outros. Mais um compositor lamechas, asseveram ainda outros. As opiniões dividem-se, é certo, mas por aqui e após o concerto de Lisboa, temas como «Close To Paradise», «Weight Of The World», «The Storm», «Mr. Tom», «Luscious Life», «Drifters», «The Great Escape», «Sleeping Beauty», «Slip Into Your Skin», etc., não param de ser ouvidas. Essencial para qualquer sonhador e um sacrilégio para quem não lhe der a devida atenção. Simplesmente espantoso (digo eu).
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A última paragem deste capítulo Patrick Watson passa por «Just Another Ordinary Day» (disco de estreia e disponibilizado à saída do concerto da Aula Magna). Os pressupostos descritos para o soberbo «Close To Paradise» são, igualmente, válidos para este «Just Another Ordinary Day». O piano e a harmonia sonora são os pilares da música apresentada. A produção e os arranjos são menos elaborados que «Close To Paradise». No entanto, a voz e interpretações ao estilo Jeff Buckley e, aqui e ali, a pisar terreno Sigur Rós e o som impregnado de referências a Michael Nyman, Björk, Antony And The Johnsons, Rufus Wainwright e Claude Debussy colocam Patrick Watson no mapa da melhor música produzida no Canadá.

A fechar deixo a mais recente aposta de «Close To Paradise», o extraordinário vídeo, realizado por Ralph Dfouni, de «The Storm».

1 comentário:

AEnima disse...

Este concerto sim... me deixou muita pena nao poder assistir. Obrigado pelo recap.