segunda-feira, 31 de março de 2008

R.E.M. | Munich

A moda das versões começa a pegar. Desta feita são os norte-americanos R.E.M., a retribuírem a revisitação que os Editors efectuaram ao clássico «Orange Crush», com uma interpretação de «Munich», um dos temas mais fortes da banda de Tom Smith. O resultado fica-se pelo interessante, já que o original é um autêntico «hit» de energia recuperado dos dias da Joy Division. Fica a curiosidade.

domingo, 30 de março de 2008

A magia dos Portishead

Perfeito! É esta a melhor forma e o melhor sentimento para descrever o mais recente concerto dos britânicos Portishead em Lisboa, no passado dia 27 de Março no Coliseu. Depois de uma primeira parte um pouco monótona, a cargo dos Hawk and a Hacksaw, banda que revela alguns contactos com a musicalidade de Zach «Beirut» Condon mas que se situa a anos-luz do mesmo, foi um Coliseu esgotadíssimo que recebeu de braços abertos o projecto de Beth Gibbons, Geoff Barrow e Adrian Utley. As expectativas eram muitas e a banda não desiludiu. Com um alinhamento irrepreensível (bem, talvez com «All Mine» metido lá no meio o resultado fosse ainda melhor; porém não me queixo) e muitos temas novos (os quais grande parte da plateia já conhecia) os Portishead mostraram-se em excelente forma e a voz de Beth Gibbons esteve melhor que nunca (sublime o momento lírico na revisitação a «Wandering Star»). Das novas composições, num registo mais minimalista, intenso e soturno, destacaram-se o intimidante single «Machine Gun», o bucólico «The Rip» e o sombrio «Threads». Das memórias de outros tempos, nos quais a melancolia foi imagem de marca, a sensação de originalidade musical mantém-se intacta. «Mysterons», «Glory Box», «Numb» e a memorável sequência «Over», «Sour Times» e «Only You» fizeram mossa. Contudo, foi necessário chegarmos ao encore para ver e ouvir «Roads»: um dos momentos mais belos e encantadores que assisti em espectáculos ao vivo. Momento único que dificilmente se repetirá.

segunda-feira, 24 de março de 2008

Radiohead | Nude

Está escolhido o segundo single de «In Rainbows» e o vídeo promocional já anda por aí. Entre as nove possíveis opções, o resultado desta autêntica lotaria recaiu sobre «Nude», um descendente directo de «Exit Music (For A Film)» e «Pyramid Song». Desde há muito composto pelos Radiohead, mas só no ano passado disponibilizado em disco, «Nude» foi durante alguns anos apresentado ao vivo e revisitado. Não sei ao certo como o fizeram, mas o resultado é simplesmente arrebatador. Fica o vídeo para conferir.

domingo, 23 de março de 2008

Viagens à tasca

Pode parecer-lhe estranho, mas ainda hoje me «revolto» contra os mais de € 17,00 por CD e/ou DVD. Tudo e todos anunciam uma qualquer crise na indústria, mas os discos, esses, continuam a sair para o mercado a rondar a fasquia dos € 20,00. E falando de edições standard, pois se há a sorte (ou o azar) de sair uma edição especial com um DVD bónus, o qual inclui material que nem ao menino Jesus interessa, o preço dispara para os € 25,00.

É verdade que já existem algumas editoras a praticar preços mais sugestivos (ou serão menos aterradores?). Por exemplo, as mais recentes edições da Domino Records e Sub Pop ficam-se pelos € 15,00. Todavia, não costumo comprar discos aquando da sua edição (exceptuando as edições limitadas das inúmeras «bandas e artistas favoritos»). Porém, mesmo assim não ficamos seguros quanto ao timing de compra mais racional. Veja-se, por exemplo, o que aconteceu recentemente com o excelente «Dreams in Colour», de David Fonseca. A primeira edição seria especialíssima e com um DVD bónus, mas há cerca de duas semanas saiu nova edição especial com um segundo CD repleto de covers (o leitor deverá estar a par da minha paixão pelas covers). Que fazer? Adquirir novamente o disco ou descarregá-lo da net? A meu ver este é só mais uma prova que, realmente, a indústria discográfica passa por um péssimo momento. Não existem ideias e as políticas praticadas só a afogam ainda mais.

Directa ou indirectamente relacionado com este cenário, os distribuidores vêem-se, cada vez mais, obrigados a «despachar» os artigos com menos saída ao preço da chuva. De quando em vez tenho a sorte de encontrar tais despojos cíclicos. Foi o que aconteceu há uns meses, quando para meu espanto encontrei as videografias de Nick Cave & The Bad Seeds, Pulp e Sonic Youth a cerca de € 5,00 cada. Confesso que ainda esfreguei algumas vezes os olhos…
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Comecemos então pelos pesos pesados Sonic Youth. «Corporate Ghost – The Videos: 1990-2002» que marca a estreia dos nova-iorquinos no formato DVD foi editado em 2004 e compila os vídeos promocionais dos álbuns «Goo» (1990), «Dirty» (1992), «Experimental Jet Set, Trash And No Star» (1994), «Washing Machine» (1995), «A Thousand Leaves» (1998), «NYC Ghosts & Flowers» (2000) e «Murray Street» (2002). Lá pelo meio também encontramos a magnífica versão de «Superstar», contributo dos Sonic Youth para a colectânea de homenagem aos The Carpenters: «If I Were A Carpenter» (1994). Todavia, o início desta história passa pelo marcante «Dirty Boots». Estávamos em 1990. O álbum a promover era o singular «Goo» e o vídeo ficou para a história como aquele em que uma jovem surgia com uma T-Shirt dos Nirvana. Por entre muitas outras experiências sonoras e visuais, as quais tiveram a ajuda de nomes como Tamra Davis, Tony Oursler, Ray Agony e Todd Haynes na realização, os Sonic Youth voltaram a evidenciar-se no campo dos vídeos em 1992, ano em que foi editado o soberbo «Dirty». Já em período pós-«Nevermind», «100%» (realização a cargo de Tamra Davis e Spike Jonze), «Sugar Kane» e «Youth Against Fascism» (realizados por Nick Egan) tomaram de assalto os canais de televisão e a aspereza sonora dos Sonic Youth associava-se à «pop» de finais dos anos 80 e inícios de 90. No entanto, os clips continuaram a evidenciar a característica visão série b que tanto diferenciou a banda no campo visual e sonoro. Vejam-se, por exemplo, a alienada «Little Trouble Girl» (realização de Mark Romanek) que conta com a participação especial de Kim Deal (Pixies e The Breeders) e «Sunday» (dirigido por Harmony Korine), no qual vemos Macauley Culkin e Rachel Miner em poses menos próprias para a MTV. A terminar encontramos a faceta mais brincalhona dos Sonic Youth. Enquanto «The Empty Page» retrata uma das muitas digressões do colectivo e algumas das suas «private jokes», «Disconnection Notice» parece um excerto de alguns dos mais caricatos acontecimentos que marcaram os últimos 20 anos da banda de New York. Essencial para qualquer fã dos Sonic Youth, «Corporate Ghost» retrata a evolução sonora e visual de uma das bandas mais marcantes do período «Nevermind».
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Chegamos aos Pulp, de Jarvis Cocker. Formados em 1978, em Sheffield, os Pulp até há bem pouco tempo eram um dos meus muitos ódios pessoais. Aquando do auge comercial do colectivo, durante a primeira metade dos anos 90, o rádio gravador lá de casa cuspia tudo o que fosse musicalmente mais limpinho (com algumas excepções, é claro). Além do mais sempre houve uma imagem mais estilizada e afogada em glamour que me fazia duvidar da banda e da sua sonoridade. Hoje percebo que este foi um dos erros mais estúpidos e inconsequentes da minha adolescência musical. Tentando recuperar o tempo perdido, ultimamente tenho ingerido doses gigantes de Pulp. Depois de ter adquirido o CD «Hits» (em mais uma campanha de final de estação), foi a vez do DVD «Hits» ir direitinho para a estante lá de casa. Se os vídeos acentuam a vertente mais popular do colectivo (em que as cores, os confetis, as danças, os jeitos e a boa disposição são uma constante), já musicalmente os Pulp são irrepreensíveis. «Babies», «Razzmatazz», «Liploss», «Common People», «Disco 2000», «Help The Aged» e «This Is Hardcore» são autênticos hinos Britpop. Refrões orelhudos, doseados com pitadas de glamour libidinoso, que nos fazem abanar a anca e acompanhar as cantorias de Jarvis Cocker: «Oh I want to take you home / I want to give you children / You might be my girlfriend, yeah, yeah, yeah, yeah...». Adicionalmente e além dos vídeos promocionais dos vários álbuns dos Pulp, dos quais destaco o burlesco «Bad Cover Version», encontramos alguns documentários e outras gravações caseiras e ao vivo de uma das bandas mais importantes da música inglesa.
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Finalmente, que dizer sobre Nick Cave e os seus Bad Seeds? Uma carreira cheia de êxitos (uns comerciais outros mais artísticos). Uma postura e carisma que lhe permitiram trabalhar com Johnny Cash, Marianne Faithfull, Kylie Minogue, PJ Harvey e muitos outros artistas. Recentemente a sua carreira tem conhecido novos desafios, estes mais relacionados com o cinema. Porém, quase que me apetece afirmar: em tudo o que Nick Cave toca algo de extraordinário acontece. O DVD «The Videos», editado em 2004, surgiu no seguimento do primeiro «The Best Of» de Nick Cave & The Bad Seeds (1998) e o resultado é mais do mesmo, ou seja, empolgante. Associam-se imagens a algumas das melhores composições de Nick Cave, desde «In The Ghetto» (1984), a «The Mercy Seat» (1988), passando por «The Weeping Song» (1990), «Straight To You» (1992), «Do You Love Me?» (1994) e «Into My Arms» (1997). Encontramos o tributo de Cave a Johnny Cash, com a versão «The Singer» (1986), e outras tantas composições que fazem de Nick Cave um dos maiores compositores da actualidade. Destaques finais para as colaborações com Kylie Minogue, em «Where The Wild Roses Grow» (1995), PJ Harvey, em «Henry Lee» (1995), e Shane MacGowan, em «What A Wonderful World» (1992). Saliente-se ainda que cada vídeo é apresentado com uma nota introdutória. Excelente prenúncio para mais um grandioso concerto em terras lusas: 21 de Abril no Coliseu de Lisboa.
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Para terminar fica o vídeo de «Bring It On», de Nick Cave & The Bad Seeds. O tema não se encontra no DVD «The Videos», pois a sua edição foi posterior à primeira compilação de Nick Cave. Porém, tudo faz prever que seja uma das canções obrigatórias em futuras colectâneas do autor australiano.

dEUS | Slow

Os belgas dEUS estão de regresso aos discos e aos vídeos. Depois de «The Architect», o primeiro avanço para «Vantage Point» (quinto álbum de originais da banda a editar a 18 de Abril), é a vez de «Slow» mostrar-se. Mais uma vez o colectivo demonstra que a letargia de «Pocket Revolution» (2006) está ultrapassada. Com uma produção a roçar o som sibilino dos TV On The Radio, Tom Barman e companhia piscam os olhos aos norte-americanos Liars para um excelente exercício sonoro. «Vantage Point» promete! Por enquanto fica o vídeo de «Slow».

quarta-feira, 19 de março de 2008

Portishead | Machine Gun

O primeiro avanço de «Third», terceiro álbum de originais dos Portishead, já chegou ao «mundo dos tubos». «Machine Gun» é o título de mais um single e vídeo do colectivo britânico. O álbum chegará às lojas só em meados de Abril, mas é já nos dias 26 e 27 de Março que poderemos ver a banda a apresentar os novos temas, nos Coliseus do Porto e de Lisboa respectivamente. Por enquanto fica o vídeo, para mostrar que os Portishead continuam em boa forma e recomendam-se.

domingo, 16 de março de 2008

QOTSA | White Wedding

Josh Homme e os seus Queens Of The Stone Age (QOTSA) continuam a promover o mais recente «Era Vulgaris» (2007). «Sick, Sick, Sick», «3's & 7's» e «Make It Wit Chu» são, até à data, os singles conhecidos. Porém, «Battery Acid» também já teve direito a vídeo promocional (disponibilizado no sítio electrónico da banda norte-americana). No entanto, é a excelente versão dos QOTSA de «White Wedding», clássico de Billy Idol, que me traz aqui. O tema foi editado como lado-b de «Make It Wit Chu». O vídeo, agora apresentado, foi registado num showcase da banda para a rádio de San Francisco Live 105.

sábado, 15 de março de 2008

Patrick What?

Já tinha lido, por aí, que os espectáculos ao vivo de Patrick Watson são consideravelmente diferentes dos registos estúdio. Ora bem, convém esclarecer que Patrick Watson, compositor da banda que dá pelo mesmo nome, nascido na Califórnia mas criado no Quebec, cedo evidenciou apetência para a música. Participou em coros de igreja, estudou jazz e piano clássico, e colaborou com os Gangster Politics (grupo de ska que integrou no liceu). Inesperadamente é a referência ao jazz que interessa agora. Porquê? Porque o jazz é uma expressão musical «rebelde», ou seja, partindo de uma base há imenso espaço para a exploração e experimentação. Foram esses os dois pontos que mais surpreenderam na noite do passado dia 13 de Março na Aula Magna. Partindo dos acordes, melodias e cadências base gravadas em «Just Another Ordinary Day» (2003) e «Close To Paradise» (2006) Patrick Watson e irmãos de estrada demonstraram como se pode e deve revisitar canções em formato live sem perder o norte. Todavia, há que expor a inicial apatia do público presente que, ansioso por ver e ouvir os temas de «Close To Paradise», lá foi decifrando excertos das mencionadas composições e adaptando-se gradualmente às sonoridades ora Godspeed You! Black Emperor, ora Pink Floyd, ora Sigur Rós, ora Mogwai e à frenética e esquizóide forma interpretativa de Mr. Watson. Assim sendo ninguém estranhou e todos menearam e aplaudiram ao som da versão mais country e mais festiva de «The Storm», ao turbilhão sonoro que foi «Drifters», ao ensaio indie de «Shame» (extraído da estreia «Just Another Ordinary Day»), ao melodioso e intrigante «Luscious Life», à visão mais cabaret alienado de «Weight Of The World», ao belíssimo momento que foi «The Great Escape» ou ao improvisado «What?» (título escolhido pelo público presente) e à versão de Eric Satie (disse que não, mas lá acabou por apresentar as duas opções colocadas à nossa escolha…). Numa sala bem preenchida, Patrick Watson revelou-se um excelente comunicador e melhor entertainer: após a actuação da banda holandesa que assegurou a primeira parte certificou-se que estava tudo ok com o seu piano; queixou-se da zoada que um dos seus instrumentos emanava; afirmou a sua amizade pelo povo português, apesar de se precipitar algumas vezes para o merci; interpretou à capela e do balcão que divide as cadeiras doutrinais da restante plateia «Man Under The Sea»; cantou os parabéns a um dos presentes; e no fim autografou alguns discos à saída do recinto. Firmou a sua posição de compositor de excepção perante o público presente e deu mostras de vir a ser um forte caso de culto em Portugal.
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Aproveitamos a boleia do concerto do canadiano Patrick Watson e da sua banda na Aula Magna para, mais uma vez, repescar um dos discos em lista de espera para se apresentar neste espaço «sonhador». Em finais de 2007 e princípios de 2008 Patrick Watson surpreendeu muitos com «Close To Paradise», o segundo álbum do(s) canadiano(s). É certo que alguns já conheciam o principal compositor, através da colaboração em «Ma Fleur», álbum de 2007 da Cinematic Orchestra. No entanto, julgo que estaríamos longe de perceber que alguns meses antes de «Ma Fleur» existiu «Close To Paradise». Editado em 2006 e descoberto no velho continente em finais de 2007, «Close To Paradise» é mais um dos grandes discos a serem produzidos em terras canadianas. «Just Another Ordinary Day» marcou a sua estreia em nome próprio, em 2003. Porém, foi com o segundo álbum que se mostrou ao mundo, vencendo o galardão máximo do Polaris Music Prize (o equivalente canadiano ao inglês Mercury Music Prize). Sâo reconhecíveis vários parentes musicais que vão desde Nick Drake à música impressionista (por exemplo, Debussy), passando por Jeff Buckley ou Björk. Em muitos momentos, revela uma fragilidade arrepiante à Antony Hegarty (Antony And The Johnsons) ou envereda por uma pop meio clássica, meio indie de Rufus Wainwright, Sufjan Stevens, Ben Folds e Jens Lekman. A voz, essa, é um misto entre a versatilidade de Jeff Buckley e a citada fragilidade de Antony. Atributos ao serviço de «Close To Paradise», um dos discos mais intrigantes, belos e sensuais dos últimos meses. Puro lirismo, dirão muitos. Disco com as cuidadas partículas que vestem a sonoridade indie oriunda de Montreal, dirão outros. Mais um compositor lamechas, asseveram ainda outros. As opiniões dividem-se, é certo, mas por aqui e após o concerto de Lisboa, temas como «Close To Paradise», «Weight Of The World», «The Storm», «Mr. Tom», «Luscious Life», «Drifters», «The Great Escape», «Sleeping Beauty», «Slip Into Your Skin», etc., não param de ser ouvidas. Essencial para qualquer sonhador e um sacrilégio para quem não lhe der a devida atenção. Simplesmente espantoso (digo eu).
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A última paragem deste capítulo Patrick Watson passa por «Just Another Ordinary Day» (disco de estreia e disponibilizado à saída do concerto da Aula Magna). Os pressupostos descritos para o soberbo «Close To Paradise» são, igualmente, válidos para este «Just Another Ordinary Day». O piano e a harmonia sonora são os pilares da música apresentada. A produção e os arranjos são menos elaborados que «Close To Paradise». No entanto, a voz e interpretações ao estilo Jeff Buckley e, aqui e ali, a pisar terreno Sigur Rós e o som impregnado de referências a Michael Nyman, Björk, Antony And The Johnsons, Rufus Wainwright e Claude Debussy colocam Patrick Watson no mapa da melhor música produzida no Canadá.

A fechar deixo a mais recente aposta de «Close To Paradise», o extraordinário vídeo, realizado por Ralph Dfouni, de «The Storm».

domingo, 9 de março de 2008

Viagens à tasca

Regressamos aos habituais percursos tasqueiros para destacar uma já longínqua visita à baixa pombalina. Já não me recordo de quais as circunstâncias para tal visita. Provavelmente um qualquer jantar rotineiro no Bairro Alto para o qual decidi efectuar um pequeno pré-desvio. A colheita mostrou-se boa e como resultado lá andei eu, uma vez mais, a noite toda a promover as lojas do saquinho verde…
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As primeiras escolhas recaíram sobre dois EPs dos norte-americanos Animal Collective. Se «Prospect Hummer», edição que conta com a participação e auxílio especiais de Vashti Bunyan, data de 2005 e resulta da fusão dos ambientes experimentais e libertinos dos Animal Collective à folk tradicional e obscura de Bunyan; «People» sugere uma qualquer celebração, mais que merecida diga-se, a «Feels» (soberbo álbum de 2005). De facto, «Prospect Hummer» aproxima-se da tão solenizada fre(ak) folk, com algumas passagens a fazer-nos lembrar a harpa e as divagações acriançadas de Joanna Newsom; e «People» caracteriza-se mais por ser uma obra ao estilo pós-moderno dos Animal Collective. Se «Prospect Hummer», a canção, remete-nos para o universo das irmãs CocoRosie e do amigo Devendra Banhart; «People», o tema, é cumulativamente espacial e festivo, com efusivos «yeah», «yeah», «yeah» à mistura. Se o instrumental «Baleen Sample» sugere uma continuação de alguns dos temas de «Sung Tongs» (de 2004 e pré «Prospect Hummer»); «My Favorite Colors» são cento e onze segundos arrepiantes, mas naturais para Avey Tare e companhia. Enquanto «I Remember Learning How To Dive» se apresenta como uma autêntica composição clerical, enquadrando-se perfeitamente em qualquer cerimónia católica e com Bunyan a mostrar que ainda tem muito para dar; «Tikwid» é melodiosa e Avey Tare volta a maravilhar-nos com as suas criativas vocalizações. «It’s You» compacta tudo o que «Prospect Hummer» enuncia e a versão ao vivo de «People» é só mais um extra. Em suma, levei para casa mais trinta minutos, em oito gravações, dos Animal Collective que merecem toda a nossa atenção: se os primeiros quinze minutos se aventuram em terrenos dream freak free folk, na voz de Vashti Bunyan; os restantes quinze minutos são mais uma prova de qualidade das experiências sonoras dos Animal Collective. Registe-se, ainda, que brevemente será editado mais um EP dos Animal Collective, intitulado «Water Curses», e que nos dias 27 e 28 de Maio a banda nova-iorquina passa pelo Cinema Batalha (no Porto) e pelo Lux (em Lisboa), respectivamente.
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A segunda aposta recaiu sobre outro dos grandes registos de 2007: «Trees Outside the Academy», o segundo álbum a solo de Thurston Moore, guitarrista dos nova-iorquinos Sonic Youth. Se há uns anos atrás nos dissessem que Moore se aventuraria a editar um álbum pop acústico e baseado na estrutura clássica da canção, provavelmente ninguém acreditaria. Porém, o passado mais recente dos Sonic Youth tem-nos mostrado excelentes momentos pop. A aspereza da banda nova-iorquina pressente-se, mas são as melodias e as texturas pop que mais se evidenciam. Por isso, este «Trees Outside the Academy» é como que um descendente directo de «Rather Ripped», de 2006. Composto entre a eficácia da guitarra acústica de Thurston Moore, a elegância do violino de Samara Lubelski, as discretas mas infalíveis percussões de Steve Shelley (companheiro de Moore nos Sonic Youth) e pontuais manifestações da guitarra de J Mascis (dos Dinosaur Jr., em cujo estúdio o álbum foi gravado), «Trees Outside the Academy» é surpreendente e «user-friendly». Ouçam-se, por exemplo, a deliciosa «Honest James» que conta com a colaboração na voz de Christina Carter dos Charalambides; a sónica e melancólica «Fri/End»; a descontraída «American Coffin» que nos mostra os dotes de Moore ao piano; o espírito punk e acelerado em formato unplugged de «Wonderful Witches + Language Meanies»; a versão acústica da crespidão Sonic Youth em «Off Work»; a balada folk de «Never Day»; a intrigante visão grunge de Thurston Moore em «Frozen Gtr»; e a introspectiva «The Shape Is In A Trance». Dando continuação aos devaneios de Moore em «Thurston @ 13», apetece-me avisar: «What you’re about to hear is some of the finest Thurston Moore’s tunes!».
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Mudando, totalmente, de corrente musical e, igualmente, de continente, volto a destacar o francês Benjamin Biolay (BB) para apresentar «Trash Yéyé» (como prometido aquando das «viagens à tasca em período de férias»). Editado em 2007, «Trash Yéyé» é o quarto álbum de originais, em nome próprio, de BB. Depois da espantosa estreia em «Rose Kennedy» (2001), da não menos extraordinária sequela com o duplo álbum «Négatif» (2003) e do menos conseguido «À L’Origine» (2005), «Trash Yéyé» vem confirmar as qualidades de BB como compositor de excepção e oferecer alguns dos momentos pop mais lascivos de 2007. Compactando de uma forma coesa e sucinta as várias aventuras discográficas de BB, «Trash Yéyé» tem a rara proeza de combinar a chanson française de Serge Gainsbourg e Arthur H com as electrónicas francófonas que fizeram história em «Moon Safari» dos compatriotas AirDouloureux Dedans»); com momentos mais clássicos e paradoxalmente mais indieRegarder La Lumière» e «Cactus Concerto»); ensejos soturnos e à lá Nick CaveLa Garçonnière»); piscadelas ao dub embebidas em discretas movimentações reggaeLaisse Aboyer Les Chiens»); e exercícios mais «radio-friendly» («Dans La Merco Benz», «Qu’Est Ce Que Ça Peut Faire» e «Rendez-Vous Qui Sait»). Razões pelas quais BB continua a ser uma das estrelas maiores na minha colecção de discos. Menção final para as baladas «La Chambre D’Amis» e «Woodstock», a faixa escondida, que podiam perfeitamente surgir na banda sonora do belíssimo «Les Chansons D’Amour» (filme de Christophe Honoré). Ora cá está mais um nome interessante para uma passagem por palcos nacionais…
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Chegamos ao derradeiro desvio para falarmos do já extinto trio norte-americano de hip-hop cLOUDDEAD. Composto por Doseone (Adam Drucker), Why? (Yoni Wolf) e Odd Nosdam (David Madson), os cLOUDDEAD são hoje um caso de culto. Em cinco anos de actividade editaram dois álbuns («cLOUDDEAD» de 2001 e «Ten» de 2004) e quase duas mãos cheias de EPs. O seu desaparecimento prematuro em 2004 deixou «água na boca» a muito boa gente. Até então só tinha ouvido alguns minutos soltos da demência do colectivo. A noção que tinha era que produziam um som não muito distante dos conterrâneos Dilated Peoples, ou seja, ambientes sombrios e urbanos, nos quais os beats e as rimas desempenhavam o papel principal. Após a audição do debut «cLOUDDEAD» testemunhei um qualquer casamento entre um hip-hop sagaz e samples de cariz cinematográfico, revelando ambientes ficcionais que nos remetem inadvertidamente para tudo e mais alguma coisa («I Promise Never To Get Paint On My Glasses Again (1)» é um excelente exemplo disso mesmo). «cLOUDDEAD» é, assim, um disco de imagens, de beats, de momentos e ambientes. O já aqui discutido formato canção é ponto que em nada interessa aos três elementos da banda norte-americana. Os sons vão emanando e a magnetização é crescente. Fico à espera de encontrar «Ten» numa futura visita tasqueira...
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A despedida faz-se ao som de Benjamin Biolay, com «Dans La Merco Benz», o primeiro single extraído de «Trash Yéyé».

quarta-feira, 5 de março de 2008

Betwe(in) Rainbows - Act 2

11 de Outubro de 2007: a febre Radiohead e «In Rainbows» eclodiam, anunciando uma qualquer revolução que, de acordo com a imprensa especializada, marcaria o fim das editoras discográficas e da própria indústria tal como a conhecíamos. Numa fulminante operação estratégica, os Radiohead disponibilizavam «In Rainbows», sétimo álbum de originais, via Internet e sem quaisquer intermediários. Enquanto que o preço do formato digital seria «à escolha do freguês», a edição física e deluxe da discbox marcava as £ 40,00 (± € 60,00). Tratando-se dos Radiohead não hesitei um minuto e lá encomendei a discbox. Os dez MP3 foram logo disponibilizados e consumidos. Contudo, no que toca a trabalhos discográficos, confesso ser ainda um pouco «old school». O ritual de comprar o disco na loja, abri-lo e explorá-lo visual e auditivamente em casa é ainda um dos meus maiores prazeres desta vida. Por isso, as primeiras audições efectuadas a «In Rainbows» souberam a pouco, pois não havia o suporte físico para a música apresentada.
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29 de Fevereiro de 2008: quatro meses e dezoito dias depois da ordem de débito na conta bancária, o bendito disco chegou ao destinatário. Note-se que entretanto a versão standard de «In Rainbows» conheceu edição comercial e desde 31 de Dezembro de 2007 que o poderemos encontrar em qualquer «tasca» que se preze. Porém, falemos da edição especial e de luxo de «In Rainbows».
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Composto por dois CD (um com o original de «In Rainbows» e outro com os lados-b) e dois vinis (que registam os dez temas que compõem «In Rainbows»), este autêntico pacote de luxo é mais um caso de perfeição na inteligente carreira da banda britânica mais importante dos nossos tempos. Esteticamente não há nada a apontar. Musicalmente «In Rainbows» faz-nos esquecer o desequilibrado «Hail To The Thief», recuperando a marca e o entusiasmante pulsar dos Radiohead. Após as viagens espaciais (leia-se electrónicas) de «Kid A» e «Amnesiac», «Hail To The Thief» ficou a meio caminho entre a experimentação e o formato clássico da canção – não era nem carne nem peixe – e a união sonora da banda, patenteada em exercícios anteriores, saiu ferida. «In Rainbows» reúne estes fab five para mais um excelente lote de canções e o disco mais coeso desde «Kid A». Aqui tudo parece estar no lugar certo: desde a desinquieta cadência de «15 Step», aos riffs incisivos e ritmo galopante de «Bodysnatchers», passando pela redenção em «Nude», a desarmante «Reckoner» e a acústica orquestrada de «Faust Arp» e terminando nas harmoniosas «House Of Cards» e «Videotape». Aparentemente tudo leva a crer que a criação musical está uma vez mais centrada nas linhas de guitarra, nos ritmos do baixo e bateria, nas melodias ao piano e na versátil voz de Thom Yorke. As electrónicas que tanto marcaram o vocalista surgem agora num segundo plano, mais moderadas e mais eficazes.

Mudamos de disco e «MK 1», primeiro tema da compilação de «leftovers» de «In Rainbows», traz consigo a melodia ao piano de «Videotape», última canção do álbum original. De imediato nos identificamos com esta continuação do mais recente registo dos Radiohead. Porém, a fasquia já não é a mesma. Composto por oito faixas, todas elas mais experimentais, os grandes destaques vão para a acelerada e descomprometida «Bangers + Mosh», para a tocante e apaixonada «Last Flowers», a etérea «Go Slowly», que podia perfeitamente surgir no alinhamento final de «In Rainbows», a sinistra «Down Is The New Up» e a simplicidade de «4 Minute Warning». No fim ouvem-se mais 30 minutos de boa música com a marca registada Radiohead.

Para terminar fica o vídeo de «Jigsaw Falling Into Place», o primeiro single extraído do mais recente trabalho dos britânicos Radiohead.

domingo, 2 de março de 2008

2008 boom de concertos

E quando pensávamos que já não nos poderiam surpreender mais, confirmam, de uma assentada, a passagem por palcos nacionais dos prodigiosos The National (concerto marcado para a Aula Magna a 11 de Maio e entretanto já esgotado) e da carismática Cat Power, a.k.a. Chan Marchall (26 de Maio no Coliseu de Lisboa)… Enquanto que os norte-americanos The National se estreiam em nome próprio e em recintos da capital portuguesa; Cat Power regressa depois de um grande concerto na Aula Magna a 4 de Dezembro de 2006. Ambas as datas já estão devidamente reservadas para os espectáculos e, entretanto, a esperança de ver Tori Amos e Fiona Apple em Portugal vai aumentando... É que tudo parece ser possível em 2008…
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Ga Ga Spoon

Há coisa de uma semana e a meio de mais um fim-de-semana a trabalhar de graça lá rumei à Aula Magna para assistir à agradável e há muito esperada estreia dos texanos Spoon em Lisboa. Na bagagem, Britt Daniel e companhia traziam o excelente «Ga Ga Ga Ga Ga» e alguns excertos de outros grandes momentos da já extensa carreira discográfica dos Spoon. A sala encontrava-se a meio gás, o que em parte poderá explicar o facto de ter adquirido o tão desejado ingresso à porta do espectáculo e com uma apetecível promoção. Depois dos rotineiros acertos iniciais, o público foi acomodando-se à ideia da sala não estar cheia para receber uma das bandas mais frescas da cena indie rock norte-americana. No entanto, foram a força e o suor dos músicos que encheram a Aula Magna e aqueceram as hostes. O grande destaque foi para «Ga Ga Ga Ga Ga», sexto álbum de carreira e uma das melhores obras discográficas de 2007. «My Little Japanese Cigarette Case», «Don’t You Evah», «Rhtmn And Soul» e «Stay Don’t Go» abriram as hostilidades de um concerto repleto de energia positiva, boas vibrações, ritmos cool, muito suor e alguma intimidade. Já sabíamos que a sensualidade e elegância sonoras dos Spoon combinavam muito bem com a quente voz de Britt Daniel em disco. Ao vivo o resultado é ainda mais desconcertante, pois a entrega é total e a sedução é mais real. Temas como «I Summon You», «The Ghost Of You Lingers», «Small Stakes», «Don’t Make Me A Target», «The Way We Get By», «The Underdog», «I Turn My Camera On» e «You Got Yr. Cherry Bomb» aqueceram ainda mais a sala e alguns corpos soltaram-se, saltando do lugar e meneando-se ao som dos Spoon. Na primeira parte vimos e ouvimos Mazgani que apresentou o seu álbum de estreia «Song Of The New Heart». Depois de ter assistido à sua discreta apresentação a solo na abertura do concerto de Kurt Wagner, no Santiago Alquimista, desta vez houve espaço para a sua banda suporte e os «ventos loucos» iranianos ganharam alguma forma. Contudo, essa mesma forma vive sempre à sombra de «Grace», de Jeff Buckley. Ainda não foi desta que me convenceu.
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A fechar deixo uma gravação da passada noite de 23 de Fevereiro para o tema «Rhthm & Soul».