domingo, 23 de março de 2008

Viagens à tasca

Pode parecer-lhe estranho, mas ainda hoje me «revolto» contra os mais de € 17,00 por CD e/ou DVD. Tudo e todos anunciam uma qualquer crise na indústria, mas os discos, esses, continuam a sair para o mercado a rondar a fasquia dos € 20,00. E falando de edições standard, pois se há a sorte (ou o azar) de sair uma edição especial com um DVD bónus, o qual inclui material que nem ao menino Jesus interessa, o preço dispara para os € 25,00.

É verdade que já existem algumas editoras a praticar preços mais sugestivos (ou serão menos aterradores?). Por exemplo, as mais recentes edições da Domino Records e Sub Pop ficam-se pelos € 15,00. Todavia, não costumo comprar discos aquando da sua edição (exceptuando as edições limitadas das inúmeras «bandas e artistas favoritos»). Porém, mesmo assim não ficamos seguros quanto ao timing de compra mais racional. Veja-se, por exemplo, o que aconteceu recentemente com o excelente «Dreams in Colour», de David Fonseca. A primeira edição seria especialíssima e com um DVD bónus, mas há cerca de duas semanas saiu nova edição especial com um segundo CD repleto de covers (o leitor deverá estar a par da minha paixão pelas covers). Que fazer? Adquirir novamente o disco ou descarregá-lo da net? A meu ver este é só mais uma prova que, realmente, a indústria discográfica passa por um péssimo momento. Não existem ideias e as políticas praticadas só a afogam ainda mais.

Directa ou indirectamente relacionado com este cenário, os distribuidores vêem-se, cada vez mais, obrigados a «despachar» os artigos com menos saída ao preço da chuva. De quando em vez tenho a sorte de encontrar tais despojos cíclicos. Foi o que aconteceu há uns meses, quando para meu espanto encontrei as videografias de Nick Cave & The Bad Seeds, Pulp e Sonic Youth a cerca de € 5,00 cada. Confesso que ainda esfreguei algumas vezes os olhos…
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Comecemos então pelos pesos pesados Sonic Youth. «Corporate Ghost – The Videos: 1990-2002» que marca a estreia dos nova-iorquinos no formato DVD foi editado em 2004 e compila os vídeos promocionais dos álbuns «Goo» (1990), «Dirty» (1992), «Experimental Jet Set, Trash And No Star» (1994), «Washing Machine» (1995), «A Thousand Leaves» (1998), «NYC Ghosts & Flowers» (2000) e «Murray Street» (2002). Lá pelo meio também encontramos a magnífica versão de «Superstar», contributo dos Sonic Youth para a colectânea de homenagem aos The Carpenters: «If I Were A Carpenter» (1994). Todavia, o início desta história passa pelo marcante «Dirty Boots». Estávamos em 1990. O álbum a promover era o singular «Goo» e o vídeo ficou para a história como aquele em que uma jovem surgia com uma T-Shirt dos Nirvana. Por entre muitas outras experiências sonoras e visuais, as quais tiveram a ajuda de nomes como Tamra Davis, Tony Oursler, Ray Agony e Todd Haynes na realização, os Sonic Youth voltaram a evidenciar-se no campo dos vídeos em 1992, ano em que foi editado o soberbo «Dirty». Já em período pós-«Nevermind», «100%» (realização a cargo de Tamra Davis e Spike Jonze), «Sugar Kane» e «Youth Against Fascism» (realizados por Nick Egan) tomaram de assalto os canais de televisão e a aspereza sonora dos Sonic Youth associava-se à «pop» de finais dos anos 80 e inícios de 90. No entanto, os clips continuaram a evidenciar a característica visão série b que tanto diferenciou a banda no campo visual e sonoro. Vejam-se, por exemplo, a alienada «Little Trouble Girl» (realização de Mark Romanek) que conta com a participação especial de Kim Deal (Pixies e The Breeders) e «Sunday» (dirigido por Harmony Korine), no qual vemos Macauley Culkin e Rachel Miner em poses menos próprias para a MTV. A terminar encontramos a faceta mais brincalhona dos Sonic Youth. Enquanto «The Empty Page» retrata uma das muitas digressões do colectivo e algumas das suas «private jokes», «Disconnection Notice» parece um excerto de alguns dos mais caricatos acontecimentos que marcaram os últimos 20 anos da banda de New York. Essencial para qualquer fã dos Sonic Youth, «Corporate Ghost» retrata a evolução sonora e visual de uma das bandas mais marcantes do período «Nevermind».
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Chegamos aos Pulp, de Jarvis Cocker. Formados em 1978, em Sheffield, os Pulp até há bem pouco tempo eram um dos meus muitos ódios pessoais. Aquando do auge comercial do colectivo, durante a primeira metade dos anos 90, o rádio gravador lá de casa cuspia tudo o que fosse musicalmente mais limpinho (com algumas excepções, é claro). Além do mais sempre houve uma imagem mais estilizada e afogada em glamour que me fazia duvidar da banda e da sua sonoridade. Hoje percebo que este foi um dos erros mais estúpidos e inconsequentes da minha adolescência musical. Tentando recuperar o tempo perdido, ultimamente tenho ingerido doses gigantes de Pulp. Depois de ter adquirido o CD «Hits» (em mais uma campanha de final de estação), foi a vez do DVD «Hits» ir direitinho para a estante lá de casa. Se os vídeos acentuam a vertente mais popular do colectivo (em que as cores, os confetis, as danças, os jeitos e a boa disposição são uma constante), já musicalmente os Pulp são irrepreensíveis. «Babies», «Razzmatazz», «Liploss», «Common People», «Disco 2000», «Help The Aged» e «This Is Hardcore» são autênticos hinos Britpop. Refrões orelhudos, doseados com pitadas de glamour libidinoso, que nos fazem abanar a anca e acompanhar as cantorias de Jarvis Cocker: «Oh I want to take you home / I want to give you children / You might be my girlfriend, yeah, yeah, yeah, yeah...». Adicionalmente e além dos vídeos promocionais dos vários álbuns dos Pulp, dos quais destaco o burlesco «Bad Cover Version», encontramos alguns documentários e outras gravações caseiras e ao vivo de uma das bandas mais importantes da música inglesa.
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Finalmente, que dizer sobre Nick Cave e os seus Bad Seeds? Uma carreira cheia de êxitos (uns comerciais outros mais artísticos). Uma postura e carisma que lhe permitiram trabalhar com Johnny Cash, Marianne Faithfull, Kylie Minogue, PJ Harvey e muitos outros artistas. Recentemente a sua carreira tem conhecido novos desafios, estes mais relacionados com o cinema. Porém, quase que me apetece afirmar: em tudo o que Nick Cave toca algo de extraordinário acontece. O DVD «The Videos», editado em 2004, surgiu no seguimento do primeiro «The Best Of» de Nick Cave & The Bad Seeds (1998) e o resultado é mais do mesmo, ou seja, empolgante. Associam-se imagens a algumas das melhores composições de Nick Cave, desde «In The Ghetto» (1984), a «The Mercy Seat» (1988), passando por «The Weeping Song» (1990), «Straight To You» (1992), «Do You Love Me?» (1994) e «Into My Arms» (1997). Encontramos o tributo de Cave a Johnny Cash, com a versão «The Singer» (1986), e outras tantas composições que fazem de Nick Cave um dos maiores compositores da actualidade. Destaques finais para as colaborações com Kylie Minogue, em «Where The Wild Roses Grow» (1995), PJ Harvey, em «Henry Lee» (1995), e Shane MacGowan, em «What A Wonderful World» (1992). Saliente-se ainda que cada vídeo é apresentado com uma nota introdutória. Excelente prenúncio para mais um grandioso concerto em terras lusas: 21 de Abril no Coliseu de Lisboa.
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Para terminar fica o vídeo de «Bring It On», de Nick Cave & The Bad Seeds. O tema não se encontra no DVD «The Videos», pois a sua edição foi posterior à primeira compilação de Nick Cave. Porém, tudo faz prever que seja uma das canções obrigatórias em futuras colectâneas do autor australiano.

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