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«Quão pouco é preciso para ser feliz! Sem música, a vida seria um erro» (Nietzsche)

Mudando completamente de assunto (ou talvez não), «Dreams In Colour» encontrava-se na lista de espera para se revelar neste espaço. Aproveitando a boleia do «mega concerto» (de quatro temas) e da preferência da maioria dos portugueses, deixamos de lado as derradeiras «viagens à tasca em período de férias» e damos especial atenção a «Dreams In Colour». David Fonseca, homem com créditos firmados em território nacional, deixou há muito de ser reconhecido como o frontman dos históricos Silence 4. Depois de dois álbuns em nome próprio bem sucedidos (tanto comercial como musicalmente) «Dreams In Colour» está aí para comprovar o estatuto de David Fonseca e consolidar ainda mais a sua importância no panorama pop/rock português. Mais uma vez as referências parecem ser as certas e mais uma vez parece conseguir transmiti-las a públicos tão distintos como a geração «Morangos Com Açúcar». No entanto, algo mudou. A melancolia e lugubridade, elementos predominantes em «Sing Me Something New» e «Our Hearts Will Beat As One», parecem colocadas num segundo plano. A pop solarenga associada ao festim de início de estação e aos «pa pa pa pa ra ra pa pa» evidenciam-se. «4th Chance» segue o espírito do super-grupo Humanos. «Kiss Me, Oh Kiss Me» está banhado com o perfume dos noruegueses Kings Of Convenience. «Silent Void» respira o rock radiofónico de uns The Killers (a última grande paixão de David Fonseca), «This Wind, Temptation» junta o melhor dos Pixies com o suspense característico dos Radiohead. «I See The World Trough You» encaixa-se perfeitamente na esfera de interesses de um Damien Rice e «Superstars» (apesar das claras diferenças é impossível não o associarmos ao proveitoso assobio de «Young Folks» de Peter, Björn & John) é mais uma das canções de David Fonseca que faz a festa toda, ou seja, lança os foguetes e depois ainda apanha as canas. Lá pelo meio encontramos a fantástica versão de «Rocket Man», de Sir Elton John. É mais um excelente regresso de David Fonseca que volta a cantar e a encantar Portugal.
É certo que «Myth Takes» não é nenhum mistake na carreira dos !!! (Chk Chk Chk), mas após o soberbo «Louden Up Now», álbum que nos deu os singles «Pardon My Freedom» e «Hello? Is This Thing On?», a efervescência new wave electro-punk de «Myth Takes» parece ter fugido para a barriga das pernas. Contudo, após «Heart Of Hearts» e «Must Be The Moon», «Yadnus» surge com a força de uns Queens Of The Stone Age e reacende a chama por esta banda norte-americana.
«Para mais segurança»...
Comecemos então pelo início. Desde cedo que Benjamin Biolay estabeleceu contacto com a música. O pai, um adepto ferrenho do clarinete, inscreveu o filho nas aulas de violino e, mais tarde, tuba e trombone. Contudo, nenhum destes instrumentos seduziu Benjamin e foi, posteriormente, através da guitarra e da cultura pop norte-americana que Biolay desenvolveu o seu apuradíssimo sentido para a construção de texturas e melodias pop. Depois de ter assinado contrato com a EMI e ter editado dois singles («La Révolution», de 1997, e «Le Jour Viendra», de 1998) sem grande sucesso, Benjamin conheceu Keren Ann, com quem compôs alguns temas para Henri Salvador e produziu os dois primeiros álbuns da artista israelita («La Biographie de Luka Philipsen» e o soberbo «La Disparition»). Pelo meio surge a sua estreia discográfica com «Rose Kennedy», um dos mais saborosos chocolates trazidos da Suiça… Se «Négatif» (único álbum conhecido até à data) mostrava um compositor acima da média, com algumas tendências melancólicas, «Rose Kennedy» comprova a grandiosidade e todo o glamour que há na música de Benjamin Biolay. Aqui, o requinte é a principal arma de sedução. «Novembre Toute L’Annee» traz consigo uma leve névoa de nicotina que se entranha à medida que o disco se desdobra. «Les Cerfs-Volants» segue o trilho de «My Way», imortalizado por Frank Sinatra, mas a referência maior é Serge Gainsbourg. «La Melodie du Bonheur» é a fusion perfeita da chanson française e da sonoridade «Norah Jones». «L’Observatoire» é a marca registada Benjamin Biolay que fez história em «La Disparition» de Keren Ann: minimalismo acústico associado a ambientes trip-hop e com adereços clássicos. «La Monotonie» é tudo menos monótona; o ambiente parece retirado de uma película do agente secreto 007, onde o suspense e a sumptuosidade marcam pontos. «Los Angeles» é o expoente máximo deste «Rose Kennedy». Exercício pop com a «cidade dos anjos» como pano de fundo. «Les Ros
es Et Les Promesses» e «Rose Kennedy» estão ao mesmo nível enquanto «Les Joggers Sur la Plage» só engrandece a vertente cinematográfica da música de Benjamin Biolay. Registe-se que a «companheira de estrada» Keren Ann também surge na ficha técnica deste «Rose Kennedy», sem dúvida um dos grandes debuts da geração 2000.
Depois do matrimónio, em 2002, com a actriz Chiara Mastroianni, Benjamin Biolay regressa aos discos em 2003 com o magnífico duplo álbum «Négatif». No ano seguinte e com a ajuda da sua actual ex-mulher (divórcio com Mastroianni ocorreu em 2005) surge Home, um projecto que nos deu um agradável conjunto de canções solarengas e pensadas para as viagens de carro. O resultado é uma autêntica banda sonora de um qualquer road movie norte-americano, apesar do francês dominar. A folk ganha terreno em relação à voluptuosidade característica em Biolay. Os temas são mais simples, o ambiente é calmo e sereno e no horizonte surge o deserto da Califórnia. Porém, a vertente sussurrante da chanson française também está presente, reflectindo de alguma forma as limitações vocais de Chiara. Nada que não nos impeça de repetir a viagem e locais como «La Ballade Du Mois De Juin», «Folle De Toi», «Quelque Part On M'Attend» vezes sem conta.
Poucos meses depois de Home, Benjamin Biolay atira-se definitivamente às bandas sonoras. «Clara Et Moi» foi a película seleccionada. A música volta a apresentar-se em bom nível. O requinte é de novo convocado mas a densidade não é tão forte, como nos dois exercícios anteriores em nome próprio. Dos 15 temas que compõem o disco só um não saiu do imaginário Benjamin Biolay, estando incluído «Au Coin Du Monde (Streets Go Down)» de Keren Ann. Se «Rose Kennedy» era aveludado e «Home» foi pensado para o asfalto, este «Clara Et Moi» é feito para o coração. O início, com «Eden Luxembourg», espalha uma certa leveza musical que associamos a uma qualquer história simples (e não banal) de «Garçon répond fille». De acordo com o grafismo do disco e do filme pensamos que «acertou na mouche». A determinada altura, desta autêntica viagem Benjamin Biolay, sentimos a crescente enculturação pela pop anglo-saxónica e apesar de termos andado perdidos pela route 66 em «Home», agora a produção é mais universal e a influência de universos como Moby e Yann Tiersen sente-se mais intensamente. Já nos ending credits ouvimos composições mais clássicas e ao piano de Benjamin. Uma banda sonora irregular mas que não nos deixa de apresentar belíssimos temas do universo BB.
Chegamos a 2005 e Benjamin Biolay, já divorciado de Chiara Mastroianni, adensa as suas tendências melancólica e anglo-saxónica com «A L’Origine». O disco, radicalmente diferente do que já tinha realizado, é capaz de ser (a par da banda sonora «Clara Et Moi») o registo menos conseguido da carreira de BB. O rock entra de rompante em cena, mas a electrónica apurada, associada à chanson française, não é totalmente esquecida. «À L’Origine», o tema de abertura, soa ao conterrâneo Arthur H (o que não o desmerece), «Mon Amour M’A Baisé» (com a participação especial de Françoise Hardy) e «Ground Zero Bar» recordam os belgas dEUS na fase «The Ideal Crash» (o que também não lhe fica nada mal), mas depois os ensejos maçudos The Edge / U2 parecem afogar o génio de Benjamin Biolay. «Dans Mon Dos» ainda traz o espírito mais clássico de BB, mas pela primeira vez soa a «já ouvido». «L'Histoire D'Un Garçon» e «Cours» aventuram-se por terrenos indie, mas a fotografia fica tremida e muito desfocada. A contemplação de «Paris, Paris», os beats embebidos de «L'Appat» e a despedida ao som dos Sparklehorse com «Adieu Triste Amour» (também com a voz de Françoise Hardy) ainda se safam, mas no fim «À L’Origine» revela-se uma manta de retalhos sem emenda possível. O primeiro grande tiro ao lado de Benjamin Biolay.
Relativamente aos Interpol, o EP «Evil» foi a razão para mais um encontro comercial. «Evil» é, porventura, a melhor canção de «Antics», o segundo álbum dos nova-iorquinos. Por isso mesmo julgamos que carece de quaisquer apresentações. Como lados-b encontramos as gravações BBC de «Evil» e «Narc» (outro dos grandes temas de «Antics»), para o programa radiofónico de Zane Lowe, e «Song Seven», uma mescla da serenidade rock de «C’mere» com o aparente desespero de «Narc». Como extra é-nos oferecido o vídeo de «Slow Hands» (primeiro single retirado de «Antics»). O disco não acrescenta nada ao reportório Interpol, mas soube e sabe tão bem ouvir a empatia existente à guitarra entre Paul Banks e Daniel Kessler…
Voltamos, por breves instantes, a Kurt Wagner e ao concerto do passado dia 17 de Outubro no Santiago Alquimista para destacar os dois trabalhos, em forma de bootleg, disponíveis à saída. Para os repetentes de espectáculos Lambchop as edições especiais de suporte às várias digressões da banda não são novidade. A recente passagem por Lisboa de Kurt Wagner não fugiu à regra e após o agradável mas longo concerto, o próprio Kurt dirigiu-se para a saída da sala e com um generoso e comercial autógrafo ajudou a vender umas quantas cópias de «Kurt» e «Succulence - Live In Vienna» (este último já disponibilizado na visita dos Lambchop, a 10 de Dezembro de 2006, na Aula Magna).
Depois da edição do difícil segundo álbum e do relativo insucesso em dar seguimento ao manifesto indie pop rock de «Silent Alarm», os Bloc Party voltam à carga com um novo single. Às primeiras audições «Flux» parece abrir novos caminhos para Kele Okereke e companheiros. A electrónica surge finalmente de uma forma clara na música do colectivo e é impossível dissociarmos esta nova aposta dos conterrâneos New Order.
«Damn, I’ve got too many songs», confessa Kurt Wagner a determinada altura da noite. Algum do público presente no Santiago Alquimista dava os primeiros sinais de cansaço quando Kurt, com um sorriso nos lábios, voltava a revolver os ‘leftovers’ das inúmeras cábulas das canções seleccionadas para a sua mais recente digressão europeia. Na mochila trazia alguns dos temas que farão parte do próximo álbum de originais dos Lambchop e canções mais antigas, as quais foram apresentadas tal e qual como vieram ao mundo. Despidas de qualquer arranjo e sem o habitual trabalho de produção, mas com o melhor que há em cada uma delas, a melodia, as «dementes» peripécias do mundo Wagner (palavras do próprio) e a voz. Não é novidade para ninguém, Kurt Wagner é detentor de uma das mais singulares vozes no panorama alternative-country da actualidade e é um dos pontos de maior interesse nos Lambchop. Desta forma e apesar do relógio marcar 1:00 da manhã, a música continuava a preencher o palco e as almas presentes, tendo o autêntico «estendal de canções» construído em palco transmitido uma vertente mais experimental e divertida ao espectáculo. Ninguém, até então, tinha dado pela falta do restante clã Lambchop, pois a essência musical, o bálsamo da passada noite de 17 de Outubro, estava presente. Houve tempo e espaço para perguntas e respostas, pequenas confissões e algumas piadas. Não estivéssemos nós a meio de mais uma semana de intenso trabalho, o cansaço não se sentiria tanto e a comunhão entre artista e público ter-se-ia prolongado até o amanhecer.
Vierwaldstätter See
Como mencionei no início destas viagens, um dos maiores objectivos era conhecer e/ou aprofundar algum do reportório local (suíço, francófono e/ou germânico). Enquanto, numa primeira fase, percorríamos as ruas de Genève rendemo-nos ao minimalismo de Keren Ann. Pelas ruas de Luzern, com o alemão a dominar, decidimos apostar nos germânicos Tocotronic. Composto inicialmente por Arne Zank (bateria), Jan Müller (baixo) e Dirk Von Lowtzow (voz e guitarra), os Tocotronic reuniram-se em 1993 na cidade de Hamburgo. Catorze anos volvidos, durante os quais editaram sete álbuns e acolheram Rick McPhail nas guitarra e keyboards, os Tocotronic são uma das bandas mais respeitadas na Alemanha. Por isso e apesar do meu espanto inicial, «Kapitulation» (oitavo trabalho de originais) obteve grande destaque por parte das «record stores» suíças. Enquanto a hora do regresso a Genève não chegava, matámos a curiosidade e ouvimos os Tocotronic e como o título do álbum anuncia, capitulámos mais uma vez ao vício.
Influenciados pelo movimento indie rock de finais dos anos 80 e inícios de 90, facilmente identificamos, nas entrelinhas deste «Kapitulation», nomes como Nirvana, R.E.M., Pavement, The Smiths, Sonic Youth ou Radiohead. «Mein Ruin», tema de abertura, prossegue o caminho deixado em aberto pelos … And You Will Know Us By The Trail Of Dead com o fora-de-série «Source Tags & Codes». «Kapitulation» junta a pop sem sal dos Razorlight ao espírito R.E.M. indie dos anos 80 e o resultado é bem aceitável. «Aus Meiner Festung» expõe os Sonic Youth de hoje a revisitarem a sua juventude sónica e suja dos anos 90. Em «Wir Sind Viele» pedem ajuda aos Mão Morta e o resultado é um dos melhores temas do álbum. Com «Harmonie Ist Eine Strategie» e «Explosion» conhecemos a vertente mais doce dos Tocotronic e através de «Sag Alles Ab» recordamos os Sex Pistols. «Imitationen» é quase a versão alemã dos The Smiths e tanto «Dein Geheimer Name» como «Luft» parecem descendentes de «Ok Computer». Enfim, o feedback das guitarras é constante, mas a harmonia está presente e dessa forma nem damos conta da estranheza da língua.
Como aperitivo deixo «Kapitulation», o único single extraído do álbum com o mesmo título.
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Zürich Hauptbanhof
Relativamente aos aclamados Franz Ferdinand e ao soberbo homónimo álbum de estreia da banda escocesa, julgo que não haverá muito a acrescentar a tudo o que já foi dito. A compra serviu para o devido upgrade da edição standard de «Franz Ferdinand» (um bem haja a quem efectuou o upgrade à cópia pirata da mesma edição standard). Porém, e como seria de prever a música voltou a seduzir. Com o serviço a milhares de kms e o telemóvel em off, foi um regalo reencontrar «Jacqueline» e cantar em uníssono «It’s always better on holiday / So much better on holiday / That’s why we only work when / We need the Money»; Como nos encontrávamos numa entusiástica cidade suíça alemã «Ich heisse super fantastische» fez mais sentido e a música dos Franz Ferdinand incendiou ainda mais as hostes («This fire is out of control / I’m going to burn this city / Burn this city / If this fire is out of control / Then I / I’m out of control / And I burn»). Nunca um disco punk rock pareceu tão dançável e nunca a expressão pop&roll fez tanto sentido como em «Franz Ferdinand». «Take Me Out» é, e será, um dos grandes hinos da geração 00; para muitos o «Paranoid Android» dessa mesma década. Apesar de não serem maníaco-depressivos, o colectivo apresenta tendências bipolares, havendo canções em que surgem diferentes temas justapostos. No fim o resultado é um autêntico caleidoscópio de cores e sons. O ritmo contagia, a seiva das canções é doce como o mel e o festim está sempre garantido. «Jacqueline», «Take Me Out», «The Dark Of The Matinée», «Auf Achse», «Darts Of Pleasure», «Michael» e «This Fire» merecem figurar na lista dos melhores temas editados nos últimos quase 8 anos.
Como bónus desta edição especial encontramos a versão single de «This Fire» (no caso «This Fffire», produzida por Rich Costey) e os lados-b de «Darts Of Pleasure» («Van Tango» e «Shopping For Blood») e de «Take Me Out» («All For You, Sophia» e «Words So Leisure», a versão acústica de «Darts Of Pleasure»). O swing punk pop rock continua lá e esta reentrada em cena serviu para amenizar as constantes incursões na junk-food e kebab.
Voltamos a tropeçar nas surpreendentes promoções helvéticas aos «American Recordings» de Johnny Cash. Desta vez o tropeção foi no volume III, intitulado «American III: Solitary Man». Mais uma vez Johnny Cash apresenta-se ao seu melhor nível. Mais uma vez o minimalismo das interpretações marca pontos. Mais uma vez a selecção de versões é surpreendente. E mais uma vez a parceria de Johnny Cash com Rick Rubin arrecadou um Grammy, na categoria de melhor performance country masculina com a magistral gravação do tema título (uma versão de Neil Diamond). Traído pela sua saúde fragilizada, «Solitary Man», editado em 2000, foi a resposta musical de Johnny Cash à crescente debilidade física. O tema de abertura marca um pouco o sentimento de Johnny Cash. «I Won’t Back Down» (original de Tom Petty) é um autêntico testemunho de resistência («You can stand me up at the gates of hell / But I won’t back down»), tal como a superior versão de «The Mercy Seat» de Nick Cave («And I’m not affraid to die»). Desta vez a lista de convidados passa por Will Oldham, Tom Petty e Sheryl Crow. As interpretações Cash de universos mais ou menos reconhecíveis são os já referidos «I Won’t Back Down» (Tom Petty), «Solitary Man» (Neil Diamond), «The Mercy Seat» (Nick Cave) e ainda «One» (U2), «I See Darkness» (Will Oldham) e «Wayfaring Stranger» (tema tradicional dado a conhecer pelos saudosos 16 Horsepower). Quanto a originais, encontramos um apetitoso «Before My Time» e algumas reinterpretações de temas com marca registada Johnny Cash, das quais se destaca «Field Of Diamonds» que conta com a participação de June Carter Cash e Sheryl Crow. Mais um grande disco de Johnny Cash e Rick Rubin!
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Chega a vez dos Shivaree. Desde que Ambrosia Parsley surgiu no éter a dar as «boas noites à lua» que faço por dar atenção a este colectivo norte-americano. Os discos são medianos, é verdade, mas encontramos sempre três ou quatro pérolas dignas de registo. Desde o tema de maior sucesso «Goodnight Moon» aos radio-friendly «I Close My Eyes» e «John 2/14», do melancólico «Oh No» aos lânguidos «Daring Lousy Guy» e «Arlington Girl», do belíssimo «New Casablanca» aos devaneios pop qualquer coisa de «Bossa Nova» e «Pimp». Não fosse o suficiente para adquirir o mais recente «Tainted Love: Mating Calls And Fight Songs», deparei com um disco de versões. Há dias confessei a minha paixão pelo formato EP, hoje tenho de revelar a minha admiração pelas covers. Para a gravação deste «Tainted Love» Ambrosia Parsley convocou não só os dois parceiros habituais (Danny McGough e Duke McVinnie) como também Benjamin Biolay, Mickey Petralia, Chris Maxwell, Phil Hernandez, Mathew Cullen, Doug Weiselman e Scott Bondy, todos eles instrumentalistas, todos eles produtores. Desta forma, cada um produziu e ajudou a edificar um ou mais temas de «Tainted Love». O disco, como informa o sítio electrónico oficial, serve para relembrar as primeiras estórias amorosas que se vive(ra)m na adolescência: o primeiro encontro, o primeiro namoro, o primeiro beijo, etc. Para que tudo corresse da melhor forma Ambrosia seleccionou alguns temas que tratam o Amor por Tu. Bette Midler (com a ajuda de Phil Spector), Chuck Berry, R. Kelly, Michael Jackson, Tanya Tucker, Gary Glitter, Ike Turner, Rick James, Möntley Crüe, Spade Cooley e Led Belly foram as escolhas finais. Mais uma vez o disco é mediano e mais uma vez encontramos agradáveis surpresas, como são os casos do smooth alucinatório «Don’t Stop ‘Til You Get Enough» de Michael Jackson (que contou com a ajuda de Doug Weiselman); o folk R&B em «Half On A Baby» de R. Kelly (produção de Mickey Petralia); a harmonia de «Paradise» original de Phil Spector mas interpretado por Bette Midler (com a marca registada Benjamin Biolay); a pop açucarada em «Hello! Hello! I’m Back Again» de Gary Glitter (com o dedo de Danny McGough); o rock em «Cold Blooded» de Rick James (participação de Phil Hernandez); a interpretação muito ao jeito cabaret de «Looks That Kill» dos Möntley Crüe (mais uma vez com o auxílio de Phil Hernandez); e a despedida em «Goodnight, Irene» popularizada pelos Lead Belly (que contou com a ajuda de Chris Maxwell). Não estamos perante o melhor dos Shivaree, é verdade. Contudo, para que tal fosse possível teríamos que efectuar uma cuidada triagem a todos os registos do colectivo, juntando o melhor num só álbum. Enquanto isso não acontece, vamos esperando por encontrar mais jóias Shivaree.
Como destaque final, apresento uma das últimas gravações dos Franz Ferdinand, a cover de «All My Friends» dos não menos aclamados LCD Soundsystem. Registe-se que o vídeo é realizado por Anna McCarthy, irmã do guitarrista Nick McCarthy.
Apesar de estarmos ainda no início de Outubro, a chegada da época natalícia já começa a agitar o mercado discográfico. A primeira das muitas «caixas de bombons» que se avizinham já foi anunciada. A histórica contribuição dos Nirvana para a série MTV Unplugged chegará, finalmente, ao formato DVD. O lançamento está previsto para o próximo dia 19 de Novembro. O concerto, registado nos estúdios da MTV em Nova Iorque no dia 18 de Novembro de 1993, tornou-se no melhor capítulo da mencionada série. O alinhamento do DVD será idêntico ao formato CD, o qual inclui dois temas nunca transmitidos via MTV («Oh Me» e «Something In The Way»). Como extras serão disponibilizadas entrevistas com os músicos, imagens dos ensaios e um documentário de bastidores. Razões de sobra para voltar a colocar os Nirvana nas listas de vendas de todo o mundo.
A segunda aposta, também um verdadeiro achado para a realidade tasqueira portuguesa, recaiu sobre a estreia discográfica dos norte-americanos The Shins. «Oh, Inverted World» é o início de mais uma viciante história de admiração. Por aqui tudo começou com Natalie Portman, em «Garden State», a afirmar que os The Shins são capazes de mudar as nossas vidas. «New Slang» era o mote para a confissão. Na tela, o rapaz após conhecer a rapariga tentava arranjar assunto para conversa e a “pequena”, um pouco envergonhada de início, refugiava-se nas doces melodias dos The Shins para não ceder aos encantos de Zach Braff. É este o ponto exacto onde os The Shins fazem a diferença e nos podem virar a vida do avesso: as melodias e consequentes construções pop. As influências são mais que muitas e vão desde os The Beach Boys aos Gorky’s Zygotic Mynci, dos The Cure aos Love, dos The Magnetic Fields aos Neutral Milk Hotel, dos The Byrds a Elliott Smith, ou mesmo dos Belle & Sebastian aos Echo & The Bunnymen. Porém, influências à parte, centremo-nos na música dos The Shins que vale por si só. «New Slang» é um autêntico toucinho-do-céu (claro que aqui a sobremesa escolhida depende sempre dos gostos de cada um). «Caring Is Creepy», um dos temas mais psicadélicos do álbum, junta os The Cure da sua fase mais harmoniosa aos The Beach Boys e o festim freak (leia-se indie) é garantido. «One By One All Day» mantém o estado alucinogénico e à segunda faixa o ouvinte capitula perante as substâncias traficadas. «Weird Divide» dá um ar mais tranquilo, mas mesmo assim telúrico a «Oh, Inverted World» e «Know Your Onion!» volta a recuperar os sons da década de 60, com os teclados à The Doors a marcarem presença. «Girl Inform Me», «The Celibate Life», «Girl On The Wing» e «Pressed In A Book» mantêm os espírito 60’s e a sedução é permanente. Destaque ainda para «Your Algebra» que recupera os devaneios Pink Floyd, na fase Syd Barret, e «The Past And Pending» que fecha «Oh, Inverted World» em espírito The Beatles.
«Stars Of CCTV» foi gravado, produzido e editado (por apenas £ 300) em Outubro de 2004 pelos próprios Hard-Fi. As primeiras 500 cópias rapidamente esgotaram. Já em Junho de 2005 e após o sucesso alcançado em concertos e do culto que andava «de boca em boca», a Another Necessary Record recupera o disco. O inconformismo e urgência de Richard Archer e companhia (muito ao estilo de uns The Clash e Sex Pistols) revelam-se numa mais valia desta autêntica colecção de singles. Política, dinheiro, subúrbios e desilusões são os temas de preferência. Mas a música também marca pontos e o rock açucarado de uns Franz Ferdinand, The Strokes, ou mesmo Dexy’s Midnight Runners, ajudam a engrandecer as suas composições pop&roll. «Cash Machine», «Tied Up Too Tight», «Living For The Weekend», «Better Do Better» e «Hard To Beat» encheram o éter e os tops europeus em 2005 e após a nomeação para o Mercury Prize publicações como o semanário NME, a revista Q e o tablóide The Sun não hesitaram em eleger «Stars Of CCTV» como «álbum do ano». Por aqui e enquanto não conhecemos o novo «Once Upon A Time In The West» vamos contemplando as 11 estrelas da constelação «Stars Of CCTV».
Voltamos a Johnny Cash e aos seus American Recordings. O volume que desta vez encontrámos em promoção foi o primeiro, o original «American Recordings». O álbum, aclamado por meio mundo, venceu o Grammy para melhor álbum de folk contemporânea e, com a ajuda preciosa de Rick Rubin, ressuscitou a carreira de Johnny Cash. A ideia, o desejo e o segredo para o sucesso da parceria Rubin & Cash era captar a essência da música e espírito de Johnny Cash. O minimalismo assumia o papel principal. Cash pegava na sua guitarra e interpretava temas novos e algumas versões. Enquanto exercícios como «Delia’s Gone» (primeiro single que contava com a participação de Kate Moss no vídeo promocional, realizado por Anton Corbijn), «Let The Train Blow The Whistle» e «Redemption» faziam as delícias dos já inúmeros seguidores de Cash; versões de artistas mais contemporâneos, como Tom Waits («Down There by the Train»), Leonard Cohen («Bird On A Wire») e Loudon Wainwright («The Man Who Couldn’t Cry») abriam as portas a novas audiências. Johnny Cash era de novo aplaudido por críticos e público. Já em 2003 a revista Rolling Stone incluiu «American Recordings» na lista dos 500 melhores álbuns de todos os tempos (posicionando-se na 364.º posição). «The Man Who Cames Around» parece estar uns pontos acima deste «American Recordings», mas o essencial continua lá e Johnny Cash mantém o nível habitual.
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